terça-feira, 28 de julho de 2009

Inquietação...

O ser humano é por natureza insatisfeito. Há uma constante inquietação que nos move. Desejamos sempre algo que não temos (que ainda não temos) e motivamos a sensação de poder que nos percorre. Ansiamos o estado pleno de prazer mas a cada instante acabamos por ser vítimas da volatilidade dos limites que concebemos.
E se assim não fosse? Teríamos força e pujança para nos desenvencilharmos dos obstáculos? Não seriam as dificuldades um atrofio à nossa própria evolução mental?
De facto, esse estado de insatisfação nato impulsiona-nos o corpo e atiça-nos a mente. Está-nos no sangue uma sorrateira propensão natural ao desafio. E nós procuramos incessantemente esse instinto de conquista, mesmo que inconscientemente, de forma tão autónoma que nem damos conta!
A cada momento precisamos de exteriorizar, de sentir, de provocar, de desafiar, de conquistar, de amar… enfim... precisamos de tudo que nos toque e nos mova. Precisamos sentir a dinâmica que nos envolve e que nos toma como presa.
Percorremos a cada instante o desejo de ascender ao patamar sensorial que nos sequestra e nos leva a desfrutar, sem limites, do nosso Eu. Aquele patamar solto e das irrelevâncias, que nos liberta a imaginação e faz da criatividade a arma, por excelência, para nos superarmos.
Nada é intocável e tudo pode ser desejável. Haja conteúdo e capacidade para volatilizar os limites e extrair da sedução o mesmo prazer da conquista. Assim, até a própria derrota nos faz crescer em vez de conter.

domingo, 26 de julho de 2009

Partir...

A emoção de partir não atenuava a saudade que já me atormentava. Eu sabia, eu sentia que não iria ser fácil, mas sorria. Só sorria! Havia em mim uma dualidade contextual que não se cruzava. Naturalmente, sem saber como, exteriorizava felicidade mas interiorizava dor e apreensão. Começaria aí, talvez, a minha primeira grande aventura, e eu precisava dela como alimento para crescer, ou sobreviver! Era, antes de mais, a primeira afirmação de personalidade e decisão irreversível. O grande sinal de que afinal já não era adolescente, já tinha a ambição de um jovem e a postura de um adulto, já não procurava protecção mas sim projecção. Queria saltar para o leito e contemplar a beleza das margens imbuído de uma dinâmica digna de contemplação. A porta do carro fechou-se e partimos.
Daí a instantes teria um comboio à minha espera, uma porta que se abriria e uma viagem que me levaria. Seria a cidade de Espinho a testemunha da minha partida. Marcharia e acataria cada regra como se fosse um desafio que só aceitamos vencer. Levaria com determinação a nova experiência ao extremo e extrairia dela os ensinamentos para a convicção do meu próprio Ser. Desprovido do passado e seduzido pelo futuro levaria no olhar a atitude e a garra de um jovem que, sensível às dificuldades, não se amedrontaria quando confrontado com a necessidade do espírito de sacrifício. A hora chegou, a porta abriu-se e eu entrei apreensivo e ansioso mas tranquilamente convencido de que esta seria a pequena grande viragem.
- Bem podias te ter safado dessa meu filho. – Dizia o meu pai cerrando os lábios e olhando em redor para disfarçar a sua apreensão.
- Mas… pai, eu sempre quis ir à tropa. Vai ver que será muito bom para mim.
A porta fechou-se e a paisagem mudava agora em cada segundo. Abríamos caminho por entre ruas e montes e todos paravam a nossa passagem como se o nosso propósito fosse a prioridade. Sentado e abstraído do interior da carruagem, observava a beleza de uma natureza que, aquela velocidade, parecia ter uma dinâmica supersónica.
Daí a pouco a porta se abriria e, emocionado, atravessaria lentamente a ponte de Santa Clara, passo a passo, em direcção ao Quartel que hostilmente me acolheria.
Era de facto minha convicção que o serviço militar iria moldar a minha personalidade e me enriquecer enquanto pessoa, enquanto jovem. Estaria, pela primeira vez, longe dos pais e daqueles que me viram crescer, estaria mais próximo de um estado de liberdade solitária, embora condicionada, mas genuína, aberta à exploração de um novo mundo e de uma nova forma de encarar a vida.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

A lágrima da partida...

Parar um pouco no tempo, sentado naquele banco, foi uma forma, talvez a única forma, que encontrei para preparar emocionalmente os momentos que, inevitavelmente, se seguiriam. Sabia que quando pegasse no meu saco e me aproximasse da saída nada seria como dantes, talvez já não fosse, pois seria engolido pelo ambiente, pela vida e pela agitação de uma cidade, que desconhecida, me chamava e me convidava a romper com o passado. Seria o grande desafio que meu Ser precisava vencer para aceder ao patamar que tanto ansiava. Não tinha margem para reverter, esta era uma viagem sem retorno.
Se fora forte na decisão teria também de ser forte na concretização. Era o momento para demonstrar a coragem que perante todos exteriorizei. E, num impulso, a mente ordenou e o corpo obedeceu. Meu olhar elevou-se, e, pegando no saco, corri para o grande arco central e atravessei a robusta galeria até à porta principal, e, aí sim, estava a linha virtual que separava os dois mundos. Parei!
Deixara para trás o brilho das manhãs soalheiras de primavera, deixara a paisagem calma dos campos verdes e o cheiro das flores que desabrochavam, deixara a beleza das sebes bem aparadas e cuidadas como tesouros, deixara as árvores que adornavam cada recanto e acolhiam os ninhos e o chilrear dos pássaros, deixara os dias de saudável odor a madeira acabadinha de aplainar, deixara o sorriso de pessoas simples que faziam de cada dia uma humilde aclamação à sua existência, deixara a harmoniosa pacatez mas tão salutar vivência humana. Deixara o abraço dos que, interiormente apreensivos, me sorriam e me cobriam do calor da sua presença. Deixara para trás as lágrimas de quem nunca me tinha visto partir, de quem sentia cada dor como se fosse um pedaço de mim, de quem me amava e que, por muito orgulho que reconhecesse da minha decisão, se recusava a abdicar do meu olhar em cada manhã. Eram lágrimas de amor, eram lágrimas de mãe.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

E se um dia não vieres?!!!

A noite vem e te traz. Tomas-me por inteiro como polvo e por cada tentáculo me sugas. Sugas cada ínfima sensação... extrais o alimento que corre em meu sangue e me secas como vampira. Penetras e te instalas em meu corpo, controlas minha mente e me expurgas do consciente! Cravas os teus dentes e me injectas o teu veneno que me consome por dentro…e depois… depois vem a adrenalina… a força de lobisomem renascido das trevas… depois devoro-te, alimento a minha alma e sacio o insaciável, o meu ímpeto que não se detém. Fazemos dos fluidos substrato e da reacção o delírio químico.
E se um dia não vieres meu corpo permanecerá inerte, vazio, despojado de calor e de vida. Não saberei o que sou, não saberei o que valho mas sempre saberei o que desejo. Porque o desejo que me mata é o mesmo que me dá vida…!

Para alguém especial…

És um "docinho" que mesmo antes de saborear me delicia contemplar! Sentir ao pormenor o seu aroma, a sua textura e tactear cada detalhe, cada poro, cada grão com a perícia de um mestre... Dissecar cada momento com a magia e profundidade de uma declamação poética mas com o tempero e a adrenalina de uma "investida selvagem"...!

domingo, 19 de julho de 2009

Chegada a Coimbra...

O sol há muito que se deitou, e as luzes eram agora o brilho de um início de noite que fazia extrapolar a sedução nocturna tão característica quanto a sua mais elementar fantasia. As pessoas passam e o movimento dos seus corpos constroem no horizonte uma coreografia humana que, com a mesma cadência, se repete e lhe dá a subtileza de um canto divinal. As suas faces escurecidas pela fraca luminosidade deixam adivinhar os contornos de uma boca, de um olhar, de um gesto numa declamação poética. E Eu, apenas Eu, ali, sentado, à espero de tudo, à espera do nada. Procuro um sinal, procuro uma cor, procuro um olhar…
Algo quebrou a cadência da coreografia humana, num ápice senti-me viajar por entre as pessoas e seus odores procurando detectar, afinal, a razão de meu olhar se regalar. Estagnei. Inerte e de pálpebras bloqueadas minha mente reteve o que meu olhar denunciou. E mesmo ali, por entre a multidão, um vulto deixava a seu lado uma silhueta de contornos arrojados e escurecidos pelo escuro da noite. O rosto escondia-se por detrás dos longos cabelos castanhos e o perfil das suas formas delineava cada pormenor com uma elegância divinal…
Era mais um rosto que se diluía nas sombras, pensava, ou justificava, talvez. Não queria abstrair-me do meu propósito e isso segurava-me o ímpeto, ou essa tendência natural para conhecer o desconhecido. Sim, porque, se é desconhecido, cada pormenor torneia uma incógnita e cada incógnita atiça a mente e a ânsia do saber, do sentir, do descobrir. É uma descoberta, pode ser uma descoberta! O simples acto de delimitar o que à ilusão vamos buscar. Parecia que, sem mais, teria sido inserido num cenário que tinha tanto de estranho como de patético. Mas que fazia eu ali? Abstraído do espaço… perdido no tempo… a divagar… a divagar… ou relembrar? Estaria eu a montar o que um dia um sonho desenhou? Não tinha respostas e ficava a sensação de que me faltavam peças. E acordei desse momentâneo estado de transe. A viagem tinha terminado! E ali estava eu, rodeado de rostos que surgiam e se diluíam nas sombras que a fraca luminosidade alimentava.
Descia sobre mim uma inércia inexplicável. Era o momento. Extasiado com a singularidade do momento e com toda aquela realidade que meus olhos observavam, não podia deixar de relembrar o quanto o desejei e o desenhei em minha mente. Pretendi e consegui, estar ali, longe de tudo e de todos que o quotidiano me impunha. Mas estaria eu encantado ou assustado? Talvez um pouco de cada! Extasiado pelo encanto e pela satisfação do desejo; assustado pelo fluxo emocional que me percorria a mente e todo o corpo. O coração batia mais forte e, não fosse o escuro da noite, meus olhos seriam tão brilhantes quanto a luz do dia, ou como quando, inesperadamente, meus lábios conheceram o sabor do primeiro beijo. A dimensão do momento só poderia me deixar assim, inerte, prisioneiro.
Estava rodeado de vida, e até as pedras do pavimento pareciam ter movimento. Pareciam reagrupar-se de cada vez que meu olhar descia e procurava nelas a refracção do pensamento, e, como um menino, imaginava desenhos com o traçado das suas fissuras e das saliências que a noite transformava em sombreado. De cada vez que levantava o olhar descobria um novo detalhe e desta vez foi o arco central que me prendeu. Rodeado por fachadas escuras e agastadas pelo tempo formava uma grande galeria que conduzia a uma grande portada e ao exterior. Dali se avistaria o que desejei e sentiria a liberdade de ser eu próprio, entregue ao meu próprio propósito. Mais um comboio que assinalava a sua chegada. As portas abrem-se e de novo a agitação se repete, como há minutos atrás, quando eu próprio também saí por uma daquelas portas.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

A NOITE

Fantasmas, mitos, clamores;
Que no escuro silêncio me enforcam,
Queimam-me as faces de terrores,
E ao meu corpo o interrogam.

O bafo das sombras me sufoca!
E os seus poderes me submergem.
Tornam a solidão cada vez mais oca,
E ao meu cérebro o subvertem.

Os abismos cativam-me com suas vozes.
E com enormes bocas me comem.
Como lobos altivos e ferozes.

O meu grito já ninguém sente!
E o meu eco será comigo,
Prisioneiro da noite para sempre...!

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Coimbra...

E ali estava Ela, bem ao alcance dos meus olhos, a imponente, a maravilhosa, a sedutora, ali estava Coimbra. O ar traz melodias e deixa nas narinas aromas de fragrâncias intensamente poéticas. Respira-se encanto e saber, respira-se poesia e sedução, respira-se virilidade e juventude, respira-se fado! O fado, sempre o fado. Aquele que aquece e enche os corações de amor e os olhos de lágrimas; o velho anfitrião da chegada e o fiel companheiro de partida; a forma mais tocante de tocar a saudade. Coimbra é um embriagante cocktail. Uma avenida aqui uma ruela acolá, um prédio moderno que intercala com uma fachada velha recheada de história, um jardim aqui uma praceta acolá um monumento além, uma calçada, uma esplanada, uma universidade, um estudante, muitos estudantes.
O horizonte é inconfundivelmente de postal. Era como se misturasse pintura com realidade e, no cair da noite, jamais se distinguiria ambas. Naturalmente belo e enriquecido pelo bom gosto humano, reflecte as luzes e as suas águas calmas libertam um aroma fresco e húmido, tão característico, tão único, tão mágico. O grande amor de Coimbra, o Mondego!

terça-feira, 14 de julho de 2009

LEVITO

E o tempo que não passa
E o vento que não vem
Sem dó me trespassa
Essa dor que me detém

Que o vento traga o teu cheiro
Que me impele e me dê vida
Tu a massa eu oleiro
Arrojo forma atrevida

Vigias-me como sonda
Percorres-me como flecha
Rebentas como onda

Como pluma levito
Como rocha te penetro
E te devoro com meu grito…

sexta-feira, 10 de julho de 2009

...e mais um capítulo...

Não tardaria e o manto da noite cobriria o horizonte com uma envolvência de mãe. As primeiras sombras apareceriam sorrateiras e imponentes, penduras de uma luz que anuncia o renascer da cidade para a noite, que traz a virilidade dos noctívagos e que dá a cada esquina uma cor tão tenebrosa quanto mágica dependendo do propósito e da coragem de cada olhar. Mas a cidade não passa de uma visão física e de uma densidade objectivamente conseguida pela própria humanidade. Não deixando de ser parte integrante de uma natureza bela que a cada um de nós pertence, vale a pena olhar mais longe, vale a pena contemplar a força, a dimensão e a beleza de tão genuína natureza, o mar. E ele surge no horizonte, cada vez mais brilhante, à medida que descemos ao seu encontro. É como se ele crescesse, segundo a segundo, bem na frente dos nossos olhos, subindo pelos nossos corpos um arrepio estranhamente familiar que nos toma por inteiro e nos faz soltar uma lágrima de emoção. A avenida estende-se até perder de vista e ao seu lado a praia de areia branca que intercala e contrasta com a imponência acidental dos penedos. Eles são a marca desta praia, são a prova de uma natureza viva, acolhendo tão estranhas formas biológicas e permitindo uma rara beleza paisagística. São a poltrona, por excelência, para o reencontro do nosso próprio Eu ou para um beijo romântico ou ainda para esboçar a frase da nossa vida! As palavras falham quando o sol nos ilude com o seu mergulho no mar. É intensamente romântico e os sentimentos brotam como uma fonte inesgotável de prazer que nos sacia e nos vicia.
-Anda, vamos ver o por do sol.
Dizia Isa com aquele brilho nos olhos e sorriso maturamente safado. Eram azuis, lindos e raros como rubis, e os cabelos longos de perfeitos caracóis que misturavam a profundidade do castanho com a espontaneidade do loiro e esvoaçavam ao sabor do vento. Esse mesmo vento maroto que não parava de provocar o seu vestidinho preto, leve, solto, divinal, que lhe dava um aspecto ousadamente feminino demarcando as suas formas. Estava feliz. Olharam-se nos olhos, deram as mãos, e adivinhando o pensamento do outro, correram pela areia da praia em direcção ao mar. De penedo em penedo lá foram subindo e entrando pelo mar adentro ate que seus olhos se perderam na dimensão do horizonte. Sentados lado a lado, inertes e silenciados pela intensidade do momento, ali ficaram até que o sol desapareceu deixando-os privadamente sós.
- Vê como é bela a natureza que mesmo perdendo o brilho do sol descobre a magia e o encanto da noite. - Dizia Isa sem tirar os olhos do leito do sol.
Ambos estavam sérios, inertes, como se cada palavra fosse um desejo profundamente ansiado. Não arriscavam sequer olharem-se, e cada um mergulhava nas profundezas do seu ser. Navegavam no seu mar e recordavam cada onda que tiveram de enfrentar para chegarem ate ao dia seguinte com o sorriso e a força invencível da juventude. Recordavam e transpunham para aquele momento um pouco da sua história e, cordialmente, da sua experiência.
- Em que pensas? – Perguntava Sérgio como que a desculpar-se do seu próprio silêncio.
- Sabes Sérgio, eu sempre comparei a vida a um grande oceano. Uma vezes tranquilo, outras agitado, outras envolvente de generosidade ou de malvadez, enfim, mas sempre com a certeza de que teremos a sua beleza no dia seguinte para voltarmos a descobrir novas sensações e desafios, nova motivação para caminhar.
Sérgio ouviu e deixou que seu olhar se perdesse na beleza daquele mar ao cair a noite. Aquilo que ouviu da boca de Isa fez-lhe subir um arrepio ate franzir o sobrolho. Sabia que Isa observava cada pestanejar seu, e que esperava dele uma reacção interior e filosoficamente ao seu estilo. Não porque lhe reconhecesse essa obrigação mas sim porque lhe sentiria essa necessidade.
- Eu sou como um barco que vês ao fundo, flutuo, por vezes meto água, temo as tempestades e tento não me aproximar demasiado dos extremos para não encalhar. Tento em cada uma das minhas rotas encontrar o equilíbrio entre as várias variáveis para que o percurso seja moderadamente racionalizado.
Em simultâneo, seus olhares procuraram-se, suas mãos uniram-se e seus lábios se fundiram. Sem uma palavra, e com um sorriso timidamente safado, olharam-se simplesmente. Tinha acontecido o primeiro beijo.

Era hora de jantar. Nada estava verbalmente planeado mas cada um sabia naturalmente da vontade do outro. A mente de cada um era como se fosse uma extensão do outro.
- Vamos jantar? - Perguntou Isa.
- Sim, vamos. - Respondeu Sérgio com a apreensão de quem experimenta uma bebida pela primeira vez.
Poderiam ficar ali a noite inteira que não sentiriam a necessidade fisiológica de se alimentarem. O momento alimentava-lhes a alma e camuflava as necessidades puramente físicas. Deram as mãos e, de penedo em penedo, lá foram descendo até à areia branca e fina da praia. O vento tocava o vestido solto e fazia os cabelos cobrirem o rosto feliz de Isa. Sentia-se leve e invulgarmente livre, de pés nus pela areia fria da praia, sandálias finas numa mão e a mão de Sérgio na outra mão, corriam pela praia emocionalmente satisfeitos por estarem juntos. Não era o grande momento das suas vidas mas, seguramente, era um dos grandes momentos. Não se conheciam há muito tempo mas parecia que muito tempo já tinha passado, muita coisa já tinham vivido e por isso sentiram rapidamente a confiança e a cumplicidade de uma velha amizade. Nunca houve encontro mas sim reencontro, era a sensação que tinham quando se olhavam nos olhos.
Sérgio era um homem maturamente jovem e responsavelmente adulto, e tinha em cada uma das suas abordagens o humor de adolescente mas o charme de trintão. Mas era, acima de tudo, um cavalheiro sensivelmente romântico, e Isa apreciava-o por isso.
Cansados e a arfar, mas sempre a sorrir, deixaram-se cair na passadeira de acesso ao passeio. Num acto espontâneo de sensualidade Sérgio pegou no pé de Isa e em movimentos carinhosamente pensados foi retirando um a um cada grão de areia, depois pegou na fina sandália de salto alto e calçou-a, milimetricamente. Sorriu, fez-lhe uma festinha no queixo, e repetiu o mesmo gesto com o outro pé.
Este instinto de ternura de Sérgio encantava Isa. Parecia que em cada movimento contemplava-a como quem venera um ente divinalmente perfeito. Dava-lhe segurança e poder, dava-lhe motivo para sorrir de felicidade. Era tudo tão espontâneo e natural mas ao mesmo tempo tão perfeito e subtilmente romântico que a deleitava.
O restaurante não era tipicamente de luxo nem era daqueles iluminados a meia-luz com velinhas estrategicamente colocadas. Era um lugar simples como ambos, e quis o acaso que, apesar da sua lotação, ao fundo uma mesinha os esperasse, um cantinho romântico onde bastava o olhar feliz e cúmplice de ambos para encherem de cor o momento. Partilharam os aperitivos, a suculenta vitela, o pezinho de salsa, o vinho tinto, partilharam palavras, sorrisos, olhares safados, discretas carícias, partilharam até os guardanapos que por descuido se trocaram, partilharam um beijo bem antes do sabor do café.
Como que por magia Sérgio fez surgir, entre seus rostos, um lindo botão de rosa vermelho arrancando de Isa um atribulado sorriso de admiração pelo truque. Isa tocou com o seu indicador direito o queixo de Sérgio, contemplou o vermelho vivo e descobriu na beleza da rosa o significado de tal gesto. Sérgio era de facto um homem detalhadamente romântico.
Tinha aproveitado o momento em que Isa se ausentou ao WC para comprar, a um africano de pele escura e agastada pelo sol, a rosa mais perfeita que trazia no seu regaço. De sorriso forçado e a suplicar pelo seu negócio ia percorrendo as mesas sugerindo uma rosa para a esposa ou para a donzela do lado, impingindo até em desespero de causa mas sem sucesso. Parecia que todos se confinavam ao prazer físico em detrimento da satisfação da alma e da sua sede de amar. Todos menos Sérgio. Com devoção, colocou cuidadosamente a rosa no seu colo esperou que chegasse o momento certo para brilhar.
Ambos tocaram a rosa, cheiraram o seu perfume e sorriram, era como se aquelas pétalas simbolizassem a beleza sentimental daquele momento.
- Minha namorada? – Perguntou Sérgio decidido e confiante olhando Isa nos olhos e procurando suas mãos.
- Sim doido! Tua namorada!

quinta-feira, 9 de julho de 2009

ESTAR CONTIGO…


Estar contigo
Era estar contente
Sentir-me forte
Pertinho de ti
Era ter sempre presente
Um raio de sorte
Era gostar
De amar e viver
De por ti chamar
De lutar pra te ter
E sem limites te amar…

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Filosofia de vida

Será a vida um misto de sensações e vivências? Tudo servirá para a preencher?
Pois… reconhecendo o direito à individualização nunca conseguiremos chegar a um conceito uniforme.
Vivê-la é o lado simplista mas preenchê-la é já um acto de exigência cognitiva. O fácil é preenchê-la com tempo, o difícil é preenchê-la com conteúdo…
Encará-la como um grande momento é remetê-la a um vazio existencial, é admitir um único sentido, a sua extinção. É atribuir-lhe um quociente matematicamente exacto, a morte. Sabemos sempre como vai terminar!
Dar-lhe a capacidade de se fraccionar é valorizá-la na sua plenitude existencial e embuti-la numa natureza que tem um denominador comum, uma regra básica, uma premissa inquestionável. Nascer, crescer e morrer! Nada pode contrariar a chave da natureza.
Respeitar e preencher cognitivamente a vida é encará-la também como um conjunto de pequenos momentos. Só com o micro podemos construir o macro. Cada momento é uma parte das partes e do conjunto das partes chegamos ao todo. Só assim conseguimos expurgar momentos e realçar os factores positivos em detrimento dos negativos. Serão esses momentos que contrariam a chave da natureza e que nos fazem justificar a sensação de felicidade. Porque cada um desses momentos nasce, cresce e não termina com morte mas sim com vida…!
Por isso encarar a vida como uma sucessão de períodos é uma atitude de capacidade e sabedoria humana…!

terça-feira, 7 de julho de 2009

...intensamente...

O céu estava limpo, a temperatura era de verão mas o vento era de inverno. Chegaram ao início da tarde com sorrisos e olhares apaixonados, perdidos entre carícias e com uma adrenalina típica de adolescente. Percorreram em corrida e de mãos dadas a passadeira de traves velhas que dava acesso à praia. Deixaram a contemplação da paisagem para mais tarde, e, sincronizadamente, soltaram as mãos, descalçaram-se, deram um beijo relâmpago e correram em direcção às ondas de onde emanava aquela brisa fresca e húmida que lhes gelava as narinas.
A praia de Miramar é bem conhecida pela sua beleza paisagística e pelo enquadramento romanticamente jovem dos seus frequentadores. Respira-se juventude, e para onde quer que se olhe enche-se o olho de cor e harmonia. É tudo muito civilizadamente selvagem! Dogmaticamente perfeito quando se avista ao fundo a capelinha do santo milagreiro. Embutida na jazida de pedra que se ergue do mar, firmada pela vontade e crença humana, transforma-se numa atípica micro ilha de culto sempre que a maré sobe e o mar anda agitado. Mas em cada dia, o milagre acontece, a maré baixa, as águas recuam e lá podem ir os crentes de pé enxuto. Sente-se o aconchego da praia quando de perto da água se vislumbram as dunas, parece que toda a extensão de areal forma uma grande galeria reservadamente romântica em dias de pouca afluência. Ao longo da cortina de água erguem-se, dispersos, penedos em forma de menires e que servem de poiso às gaivotas e ancoradouro às algas soltas.
Isa estava extasiada. Caminhavam lentamente sobre a areia molhada enquanto conversavam e sorriam. Empenhadamente impunham a cada palavra um ritmo e uma satisfação apaixonante. Isa quis conhecer a capelinha, e como crente que é, fez questão de subir as escadinhas e de entrar na porta rústica de molduras mordiscadas pela agressividade do clima e prestar em silêncio o seu culto oratório. Em silêncio entrou em silêncio saiu. Procurou a mão de Sérgio e foram subindo as restantes escadas em torno da capelinha ate à pequenina abertura que dá acesso à jazida rochosa onde as ondas rebentam e enchem o ar de salpicos. Sentaram-se na rocha mais elevada e, tomando os braços, experimentaram um beijo húmido e temperado pelo mar.
Trocaram o cenário marinho pelo aconchego do carro, o vento agreste pelo calor dos seus corpos, o rebentar agitado das ondas pela música calma e pelo prazer de um colo. Falaram da vida, das suas filosofias, da actualidade irreverente, fizeram trocadilhos, soltaram gemidos e perderam-se entre carícias sem notar que o tempo avança sem piedade, insensível aos preceitos do momento.
Sérgio relançou Isa e, tomando-a de assalto, olhando-a nos olhos, sugeriu a surpresa.
- Vamos voltar à praia!
- Mas Sérgio, o vento, o clima agreste…
Sérgio saiu do carro de instinto afrodisíaco, abriu-lhe a porta e, pegando na sua mão, puxou-a para que sentisse que afinal já não havia vento. Correram ambos em direcção ao mar. Só a praia permanecia a mesma, o clima era outro. O mar agora estava calmo, a lua cheia apareceu no céu e as estrelas começavam a emanar o seu brilho. Ao fundo a capelinha e o seu encanto nocturno que decorava o horizonte com a sua branca iluminação.
- Lindo! Exclamava Isa ao ouvido de Sérgio.
- Perfeito meu amor!
Brotou dos seus corpos uma viril e electrizante adrenalina e não tardou o abraço, o beijo, os sorrisos e gemidos safados. Rolaram entrosados pela areia fria e húmida e as suas roupas soltaram-se quando a emoção encheu os seus corpos de suor e por cada poro emanava o calor e o odor da paixão. Sérgio percorria milimetricamente Isa com beijos e carícias e esta soltava a cada toque um gemido profundo de um prazer ocultamente alcançado.
A praia deserta, o silêncio apenas quebrado pela melodia do mar, os seus corpos possuídos pelo prazer, tudo delirantemente belo e apenas com dignos cúmplices do momento, a lua, as estrelas, o mar e a capelinha iluminada que dava ao momento um alcance divino.
Foi durante muito tempo que suas mentes ascenderam a permaneceram numa dimensão supra humana. Uma espécie de patamar de prazer por excelência. Um verdadeiro estado de satisfação plena, prolongado pela plenitude dos seus movimentos.
Estava consumada talvez a maior fantasia de ambos e levada ao extremo com a criatividade de quem ama até aos limites do seu ser. Três grandes gritos de prazer saíram das profundezas de Isa. Percorreram toda a praia e o seu eco voltava como vindo do infinito. Um minuto de silêncio e dois de hilariantes sorrisos enquanto procuravam, extasiados e em corrupio, as suas roupas espalhadas pela praia.

E VIAJO…

É no escuro e no silencio da noite
Que procuro a paz
Mas não encontro.
Umas vezes durmo mas não descanso
Outras apenas descanso não durmo
E viajo… e viajo…
E viajo pelos prazeres que já tive
Pelos desejos que me tomam
Pelas mãos que me vibram
Pelos braços que me envolvem
Pelos olhares que me despem
E viajo… e viajo…
E viajo pelas emoções que me percorrem
E que meu ser teima em alcançar
Eu preciso sentir a cor do romance
Eu preciso de amar…!